"Verá a sua
posteridade e prolongará os seus dias; e a vontade do Senhor prosperará nas
suas mãos. Ele verá o fruto do penoso trabalho de sua alma, e ficará
satisfeito"
(Isaías 53:10-11). Os versículos finais de Isaías 53 levam a história do Servo
sofredor a uma conclusão tão surpreendente como seu começo. O profeta tinha-nos
dito como terminaria até mesmo quando ele começou sua profecia (52:13), mas, na
realidade, toda essa rejeição e sofrimento humilhante atingindo o clímax com a
morte vergonhosa, pode tornar incrível um final feliz. Mas aí está.
Até agora o Servo do
Senhor tem sido passivo, submisso, sem resistência. Mas do silêncio de seu
sepulcro explode uma enorme energia. Não a despeito, mas por causa de seu
sofrimento, o Servo do Senhor começa poderosamente a elaborar seu destino
apontado. "Por isso eu lhe darei muitos como a sua parte, e com os
poderosos repartirá ele... porquanto derramou a sua alma na morte..."
(53:12). O eterno propósito do grande Deus era para ser elaborado nas próprias
mãos que tinham sido danificadas por nossos pecados. O triunfo do Servo foi,
por sua magnitude, eclipsar sua humilhação. O manuscrito de Isaías dos
Pergaminhos do Mar Morto diz em 53:11: "Do trabalho penoso da alma
para a glória sem limites, do sofrimento para a plenitude de graça!"
Sobre o que não cabe
em questão aqui é que Isaías está entre aquelas vozes do Velho Testamento que
falaram muito de antemão da ressurreição do Messias dentre os mortos (Lucas
24:44-46). Davi certamente falou dela (Salmo 16:8-11; Atos 2:25-31; 13:35-37),
mas não mais poderosamente do que o grande profeta messiânico de Judá. Não
admira, então, que Jesus lidasse tão severamente com a teimosa descrença dos
saduceus na própria idéia de uma ressurreição (Mateus 22:23-32). Ou que ele
censurasse os dois discípulos confusos na estrada de Emaús porque eles não
tinham entendido, por aqueles mesmos profetas, os eventos que tinham aniquilado
seus espíritos, que a glória para o ungido do Senhor precisava vir pelo caminho
do sofrimento e da morte (Lucas 24:25-27).
Mas faríamos bem em
não lidar com esses discípulos desalentados tão hipocritamente. Cremos em sua
ressurreição não tanto pelo testemunho dos profetas quanto pelo testemunho dos
apóstolos. E às vezes tudo é causa para admirar se temos entendido o grande
princípio que atravessa o evangelho, tanto na profecia como na proclamação, que
para os discípulos de Jesus, assim como para seu Mestre, não há glória sem sofrimento.
É "...através de muitas tribulações, nos importa entrar no reino de
Deus" (Atos 14:22), "... todos quantos querem viver
piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos" (2 Timóteo 3:12).
Cada cristão tem um encontro marcado com a aflição (1 Tessalonicenses 3:3-4),
não simplesmente porque ser um cristão nos põe em dificuldade, mas porque as
provações são essenciais à elaboração do eterno propósito de Deus para nossas
vidas. É no cadinho do sofrimento que nossa fé é purificada (1 Pedro 1:6-7) e
pela provação de nossa fé que o espírito pertinaz de resignação necessário a
nos manter confiantes e servindo o Senhor até o fim é produzido (Tiago 1:3-4).
Pedro diz que fomos "chamados" para suportar as aflições e sofrer
injustamente, "...pois que também Cristo sofreu em vosso lugar,
deixando-vos exemplo para seguirdes os seus passos..." (1 Pedro
2:21).
É o Servo sofredor
que tornou possível para nós regozijar na humilhação e sofrer por casa dela
porque ele ligou para sempre o sofrimento à glória. Paulo afirma triunfantemente
que cada cristão deveria saber que "nossa leve e momentânea
tribulação produz para nós eterno peso de glória" (2 Coríntios
4:17) e "que os sofrimentos do tempo presente não podem ser
comparados com a glória a ser revelada em nós" (Romanos 8:18).
Portanto, ele diz "...e gloriamo-nos na esperança da glória de Deus.
E não somente isto, mas também nos gloriamos nas próprias tribulações, sabendo
que a tribulação produz perseverança; e a perseverança, experiência; e a
experiência, esperança" (Romanos 5:2-3).
Pedro começa sua
primeira epístola louvando a Deus pela esperança viva pela qual fomos gerados
de novo "mediante a ressurreição de Jesus Cristo dentre os
mortos" (1:3). O corpo de sua carta é então dirigido ao sofrimento
que necessariamente acompanha a vida do povo de Deus, e fecha com estas
palavras: "Ora, o Deus de toda a graça, que em Cristo vos chamou à
sua eterna glória, depois de terdes sofrido por um pouco, ele mesmo vos há de
aperfeiçoar, firmar, fortificar e fundamentar" (5:10).
E como sabemos que
isso é verdadeiro? Porque temos visto a glória que foi revelada em Jesus
Cristo. E não devemos jamais ser encontrados de novo duvidando da providência
de Deus no meio de nossa dor. O Deus eterno glorificou eternamente em seu Servo
sofredor a dor e a humilhação dos inocentes. Da desgraça veio a exaltação, e do
sofrimento, glória. Que o Senhor, portanto, nos livre de uma infidelidade
lamurienta e nos dê uma alegria triunfante em todas as nossas tribulações,
quando olhamos com admiração para Jesus "o qual, em troca da alegria
que lhe estava proposta, suportou a cruz, não fazendo caso da ignomínia, e está
assentado à destra do trono de Deus" (Hebreus 12:2).
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